Acredite naqueles que buscam a verdade. Duvide dos que já a encontraram. André Gide
terça-feira, 28 de fevereiro de 2006
Links Legais
A forma como vandalizamos cartazes diz muito sobre nossa sociedade.
www.propagandacritic.com/gallery/
Vídeos institucionais inacreditáveis.
emmaf.isuisse.com/indanarcook.html
"O livro de receitas do anarquista". Deviam proibir que uma coisa dessas circulasse na web.
heritage.stsci.edu/gallery/gallery.html
Imagens fantásticas do espaço.
www.blifaloo.com/info/lies.php
Como descobrir se uma pessoa está mentindo?
www.the7thfire.com/new_world_order/mind_control/battle_for_your_mind.htm
A batalha pela conquista de sua mente e técnicas de lavagem cerebral.
www.acidlogic.com/interesting_motherfuckers.htm
"Fedaputas interessantes" seria uma tradução possível dessa galeria de tipos excêntricos, de Saddam Hussein a Alice Cooper, passando por Akira Kurosawa (entre muitos outros)!
www.secretsituation.com/danger/datum.htm
Uma espécie de portal de coisas bizarras, algumas bem bacanas.
É isso que dá quando você passa um carnaval chuvoso em casa.
sábado, 25 de fevereiro de 2006
Buemba! Barbie chuta Ken e se enrosca com anão de jardim
Who cares?
Relato de um padre protestante europeu na Segunda Guerra. Diz mais ou menos assim: "Quando vieram os nazistas e levaram os judeus eu não falei nada porque não era judeu. Aí depois eles levaram os ciganos, os gays, os comunistas e eu não me manifestei em nenhuma das vezes porque não pertencia a nenhum desses grupos. Até que eles vieram me buscar e eu não pude reagir porque não havia ninguém mais para me defender."
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2006
Movie Quotes - Parte 3
- I've lived in this city all my life. I grew up on the
- It's a strange world. (Blue Velvet)
- Detective Tom Polhaus: [picks up the falcon] Heavy. What is it?
Sam Spade: The, uh, stuff that dreams are made of.
Detective Tom Polhaus: Huh? (The Maltese Falcon)
Salvador Dalí - O Homem Invisível (1929-31)
Waking Existencialism
Do "Waking Life":
http://www.wakinglifemovie.com/
terça-feira, 21 de fevereiro de 2006
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2006
Movie Quotes - Parte 2
I'll tell you everything, and you tell me everything, and maybe we can get through all the piss and shit and lies that kill other people. (Magnolia).
Eu conto tudo para você e você conta tudo para mim e talvez a gente consiga superar todas as merdas e mentiras que matam as outras pessoas.
Most people don't know how they're gonna feel from one moment to the next. But a dope fiend has a pretty good idea. All you gotta do is look at the labels on the little bottles. (Drugstore Cowboy)
A maior parte das pessoas não sabem como elas vão se sentir de um momento para outro. Mas um viciado sabe. Tudo que tem que fazer é olhar os rótulos dos frasquinhos.
If there's any kind of magic in this world, it must be in the attempt of understanding someone, sharing something. I know, it's almost impossible to succeed, but... who cares, really? The answer must be in the attempt. (Before
Se há algum tipo de mágica neste mundo, deve ser a tentativa de compreender alguém, de compartilhar algo. Eu sei, é quase impossível ser bem sucedido, mas quem se importa, realmente? A resposta deve estar na tentativa.
Ernest Hemingway once wrote:"The world is a fine place and worth fighting for". I agree with the second part. (Seven)
Hemingway uma vez escreveu: o mundo é um bom lugar, onde vale a pena lutar. Eu concordo com a segunda parte da frase.
Get busy living or get busy dying. (Shawshank Redemption)
Ocupe-se com a vida ou ocupe-se com a morte.
Sobre "Waking Life"
Desculpem por eu repetir o tema, mas tem um outro diálogo nesse filme que eu não podia deixar passar batido. Achei no http://imdb.com
E dessa vez vou traduzir:
"- Você é um sonhador?
- Sou.
- Não tenho visto muitos ultimamente. As coisas têm sido duras para eles. Diz-se que o sonho acabou, ninguém mais sonha. Mas o sonho não morreu, só foi esquecido, removido de nossa língua. Ninguém mais ensina sobre "sonhar", então ninguém sabe que o sonho existe. O sonhador é banido para a obscuridade. Bem, eu estou tentando mudar isso, e espero que você também. Sonhando, todos os dias. Sonhando com nossas mãos e nossas mentes. Nosso planeta está enfrentando os maiores problemas de toda sua História. Então, não importa o que você faça, não se sinta entediado, esta é absolutamente a Era mais instigante que você poderia escolher para viver. E as coisas estão apenas começando..."
Movie Quotes - Parte 1
Quando eu era moleque colecionava tampinhas de garrafa. Larguei as tampinhas e adotei os selos. Abandonei os selos e involuntariamente passei a colecionar mancadas, foras, frases inoportunas, tipo: "Você tá grávida! Parabéns! Pelo jeito vai nascer por agora!". "Não, eu só engordei mesmo..." Me tornei perito em criar situações constrangedoras. Mas não era disso que eu queria falar. De uns tempos prá cá passei a colecionar frases de filmes. Não de qualquer filme. Coisas como "Waking Life", um filme único, a começar por ser inclassificável. Parece um documentário. E os diálogos, ah os diálogos... Vamos a eles:
- There's only one instant, and it's right now. And it's eternity.
- The trick is to combine your waking rational abilities with the infinite possibilities of your dreams. Because, if you can do that, you can do anything.
- We have got to realize that we're being conditioned on a mass scale. Start challenging this corporate slave state.
- The idea is to remain in a state of constant departure while always arriving.
sexta-feira, 17 de fevereiro de 2006
Rumble Fish
Um dos mais belos filmes dos últimos 30 anos. Acho que não é para qualquer público, é triste. A fotografia em preto-e-branco - maravilhosa na minha opinião - também ajuda a explicar a impopularidade do filme. O personagem de Mickey Rourke não vê as cores, exceto nos peixes-de-briga (ou betas), daí o título. Filmado em 83, tem também no elenco Matt Dillon, Diane Lane, Dennis Hopper, Nicholas Cage, Lawrence Fishburne, Tom Waits etc. E foi dirigido por Francis Ford Coppola, que está produzindo para o cinema a adaptação do livro "On the Road" (no Brasil, "Pé na Estrada") de Jack Kerouac, a bíblia dos beatnicks.
O declínio do Império Americano, Invasões Bárbaras... a História se repete?
Acabei de ter uma idéia. Gosto de pensar nas similaridades entre o apogeu e queda dos Impérios Romano e Norte-Americano. Na Antiguidade, tinha-se a opulência das orgias; comida, sexo e diversão ocupavam a elite romana enquanto o Império iniciava sua decadência, sufocado por sua própria ambição desmedida. O hedonismo romano se repete na sociedade americana: um povo obeso, viciado em fast food e pornografia, que se julga superior aos outros. Assim como vemos hoje na desastrosa política externa ianque, os responsáveis pela derrocada romana não foram exércitos ricos e organizados, mas caóticas tribos "bárbaras" forçadas a invadirem terras romanas para não morrerem de fome em seus territórios. Ou alguém acha que a resistência iraquiana não seja primordialmente um ato de sobrevivência? E aquele cara fez "O declínio do Império Americano" e agora "Invasões Bárbaras". Será que, assim como naquela música dos Propellerheads, (acho que o nome é esse) a História não estaria se repetindo? 11 de setembro seria o marco do fim da hegemonia americana. A primeira das muitas "invasões bárbaras" contra o "mundo civilizado". Até onde elas vão chegar? Não vi o filme, mas falam que o filho rico suborna todo mundo num lamentável hospital público para o pai socialista ter um tratamento digno. O poder corruptor do dinheiro, assim como a constatação da falência do socialismo como uma possibilidade seriam outras hordas bárbaras contemporâneas. Mas o que eu pensei foi: pelo que aprendi na escola, depois dos bárbaros vem o Medievalismo. É isso. Vivemos, ao menos no Brasil, uma estúpida Era Medieval. Talvez nunca sequer tenhamos saído dela. No lugar dos garbosos cavaleiros com seus pagens e elmo, temos o culto ao automóvel, que como foi bem observado num diálogo do filme "Amarelo Manga", no Brasil vale mais que o caráter. A elite se encastela em condomínios fechados e abandona grandes aglomerações urbanas. Mal se nota a presença ou mesmo a existência do Estado, exceto na defesa das elites e na repressão sistemática aos menos favorecidos. O vazio espiritual que hoje todos sentem e alguns tentam preenchê-lo abraçando religiões caça-níqueis e tornando-se pessoas quase lobotomizadas, também estava presente no Medievalismo, tanto que organizaram uma porrada de cruzadas para conquistarem a "Terra Santa" que só resultou num ódio ancestral cultivado até hoje. Não há justiça, então faça a sua, pensava o medieval knight ou um brasileiro qualquer, antes de furar uma fila, ou matar alguém numa briga de trânsito, ou entrar na política para roubar dinheiro público, ou treinar seu cão pit-bull para estraçalhar pessoas. Bem-Vindo à Idade Média.
quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006
Palavreado (fragmento)
- Cisterna! Vanglória!
São suas escravas que vêm prepará-la para os ritos do amor. Lipídio desfaz-se de suas roupas - o sátrapa, o lumpen, os dois fátuos - até ficar só de reles. Dirige-se para a cama cantando uma antiga minarete. Lascívia diz:
- Cala-te, sândalo. Quero sentir o seu vespúcio junto ao meu passe-partout.
Atrás de uma cortina Muxoxo, o algoz, prepara seu longo cadastro para cortar a cabeça do trovador.
A história só não acaba mal porque o cavalo de Lipídio, Escarcéu, espia pela janela na hora em que Muxoxo vai decapitar seu dono, no momento entregue ao sassafrás, e dá o alarme. Lipídio pula da cama, veste seu reles rapidamente e sai pela janela, onde Escarcéu o espera.
Lascívia manda levantarem a Ponte de Safena, mas tarde demais. Lipídio e Escarcéu já galopam por motins e valiums, longe da vingança de Lascívia.
Luís Fernando Verissimo
terça-feira, 14 de fevereiro de 2006
Edward Hopper
Sei que a audiência deste blog é mínima, mas formada por pessoas muito interessantes. Então seleciono o que postar com bastante critério, sempre ressaltando o alto grau de identificação que tenho com minha escolhas. A seguir uma pequena biografia dele:
Americano, nasceu em 1882 e morreu em 67. Sua obra explora a solidão da América contemporânea com bastante realismo. Faz um uso bastante incomum da luz para destacar um certo clima de desolação. É instigante o fato de ter enxergado além da aparente prosperidade imaculada do pós-guerra. Por trás de suas belas casas nos subúrbios ricos e de seus reluzentes rabos-de-peixe, os americanos tentavam esconder suas angústias e inquietações, mas Hopper soube captar esses sentimentos como ninguém. Dessa forma, pode-se dizer que ele antecipou o movimento hippie e a contracultura dos anos 60, desnudando elementos-chave que motivariam a revolta dos jovens anos depois.
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2006
Conto: Mais um Campeão de Audiência
Escrevi essa história há uns dois anos. Achei o rascunho esses dias e resolvi publicá-la. Críticas são bem vindas, podem malhar à vontade.
Olá. Você me conhece. Estou na tevê toda semana, horário nobre. Você também pode aparecer, mas se for na minha hora sai caro. Cem mil reais cada dez segundos. Aqui pro Andy Warhol que no futuro todo mundo vai ter quinze minutos de fama. No meu show, não. É o programa mais comentado do país. Tenho controle sobre tudo no meu show. Há o meu dedo em cada figurino, em cada enquadramento daquilo que uma vez ouvi um fã dizer que é sua única hora de felicidade na semana. Veja bem você o tanto que meu show é importante. Consigo unir o carisma do Sílvio Santos à virilidade do Wando, sem falar no meu incomparável talento para protagonizar as histórias, algumas escritas do meu próprio punho. Como diria o Larry King, sou o autêntico one-man show.
Tento surpreender a cada semana. Uma vez é uma sitcom, – sou também um ótimo humorista – na outra já é uma aventura policialesca com um cara cínico e durão. As músicas são um capítulo à parte. É claro que todos querem ter suas canções escolhidas para o meu show, então tem sempre um bando de puxa-sacos de gravadoras me dando cds para eu ouvir no meu importado alemão vermelho e então decidir quem vai ter a honra de animar minhas peripécias na tevê. Mas eu só mexo com biscoito fino. Afinal de contas, já me tornei um referencial, tanto pela qualidade técnica do meu show quanto pela imaginação de meus redatores. Para não parecer pedante, não vou nem mencionar a edição ágil e a fotografia esmerada. Saio com a produção em busca das melhores locações, como já disse, nada acontece no meu show sem que eu não saiba. E tem mais: com um telefonema sou capaz de levar desconhecidos ao estrelato ou arruinar a carreira de atores consagrados. Conhece a Jéssica Penafiel? Fui eu quem a indicou pro Big Brother, e de quebra um papel na novela das oito. Logo vamos estrear a nova temporada, trazendo muitas inovações, e vou te confessar uma coisa: por trás de todo meu poderio sou um manteiga-derretida, me apaixonei pela Jessie e tive que garantir a ela que terá participações de destaque nos próximos programas. Isso a acalmou um pouco e reaqueceu nosso relacionamento, ultimamente ela andava meio arredia. Temos três idéias prontas, com sinopse e tudo e cabe a eu escolher qual delas irá ao ar. Na primeira, ao som de música trance, sou um jovem herdeiro de um bilionário que foi assassinado, mas que todo mundo acha que morreu do coração. Na outra sou um superespião equipado com um foguete nas costas que faz ele voar enquanto toca aquela música de discoteca dos anos 70, Ring my Bell. Alguém aí conhece esta? Sabia que ninguém ia conhecer, esta juventude é tão alienada que meu sobrinho já tem dezenove anos e nunca viu Os embalos de sábado à noite. A última opção conta a história de um estudante universitário toxicômano que transita por desde favelas até restaurantes caros, lançando um olhar singular ao caos urbano, meio existencialista. Não estou preocupado com a escolha, sei que qualquer um vai ser um tremendo sucesso, mas desta vez quero fazer algo mais audacioso, mais autoral, então vou ficar com esta última sinopse, tocando “Hey bulldog”, dos Beatles, na abertura. Amanhã mesmo mostro o roteiro para os mandachuvas e descolo uma verba.
II
Este mundo não me merece. Hoje descobri que sou uma das pessoas mais solitárias do mundo. Tudo bem, não me importo. Homens à frente de seu tempo são naturalmente sozinhos, pois suas idéias avançadas sempre se chocam contra o sistema. Incomodamos, botamos o dedo na ferida. Por isso que aqueles engravatados não aprovaram o roteiro. Para começar eles não entenderam nada. Tudo bem. Não tem problema. Vou receber uma gigantesca indenização pela quebra de contrato e com a grana vou montar minha própria produtora. Eu não cabia mais naquele esquema artificial da emissora. Aqueles babacas acham que entendem do riscado, mas estão totalmente fora de sintonia com o público. Eu conheço meu público. Meu show tem a capacidade de entreter simultaneamente desde o avô até o netinho. É impressionante. E quando eu digo que meu público está pronto para meu novo show eu sei do que estou falando. Mas eles se recusam a enxergar isso, então, que posso fazer? Perdoai-os, Senhor, pois eles não sabem o que fazem. Nem a Jéssica. Não consigo falar com ela. Vou trilhar meu caminho solitário, que é tortuoso, mas me levará ao Olimpo. No mínimo.
III
Eu não disse que são uns babacas? Enganei aqueles executivos otários direitinho. Logo depois que tomei a decisão de sair da emissora, levando comigo toda minha equipe, um emissário deles me procurou propondo um acordo. Eu teria minha história filmada desde que fizesse umas alterações no roteiro. Aí eu prometi reescrevê-lo: podei uma frase de duplo sentido aqui, uma cena com pivetes cheirando cola ali, e mandei para eles. Na verdade a trama ficou quase igual, não fiz quase nenhuma concessão e eles engoliram aquilo como se fosse mais uma pseudocrítica da sociedade: rebelde e contestadora na aparência, mas com conteúdo inofensivo. No entanto, o que havia de mais provocador no roteiro, assim como a mensagem final, foi preservado. Eu tinha bolado um desfecho triste para a história com o intuito de fazer as pessoas refletirem um pouco sobre suas patéticas existências, mas me convenceram a fazer um final feliz. Mas mantive a frase que um coadjuvante diz sobre o desperdício de comida nos lares burgueses. O diretor de marketing deu a idéia de mudar o título de “Você-sabe-o-meu-nome Show” para “Crônicas Alternativas”. Achei essa sugestão extremamente indelicada da parte deles e ao ouvir aquilo comecei a sentir umas palpitações. Dane-se, as pessoas vão enxergar meu gênio criativo flamejante por trás desse nome idiota. O fato de o protagonista ser usuário de drogas incomodava bastante os executivos, na verdade ele não pode nem fumar Freea, conforme estava no roteiro, porque eles já tinham fechado o patrocínio com os cigarros Oliú, então mudei seu vício para filmes com o Jean-Claude Van Damme. Isso também não prejudica em nada minhas intenções, pois o drama da dependência, a desgraça da família, a agonia da abstinência, tudo é igual, não importa a droga. Em suma: a essência da minha história permaneceu intocada. A Jéssica, em respeito a mim, foi confirmada como par amoroso do ator principal. Por isso eu quase que nem liguei, só comecei a suar um pouco e a palpitação piorou, quando na reunião que antecedia o início das filmagens fui comunicado que já tinham o ator que faria o protagonista, Pablo Algaz, e que como eu havia escrito o roteiro seria justo eu não atuar no programa, cedendo meu papel a um ator menos famoso, mas com potencial. Garantiram que assim que meu cabelo parasse de cair e eu conseguisse controlar o peso eu voltaria a atuar. Afinal de contas, eu sempre fora conhecido não só pelo meu extraordinário talento, mas também por minha humildade e generosidade. Pelo menos foi isso que o diretor de marketing me falou. Fazia sentido. Conseqüentemente, o que não fazia sentido era ter meu nome no título, já que eu não atuaria. Eu posso ser um gênio, mas quem sou eu para negar a Lógica? Concordei, enquanto lutava para parar com o tique nervoso que subitamente me acometeu, piscando e botando a língua para fora. Neste momento um outro engravatado perguntou se estava tudo bem comigo. Claro, respondi, tentando elevar-me da cadeira de um modo que eles não notassem o quanto eu tremia. Digo tentando porque as pernas bambearam e caí no chão. Me levantaram, eu tremia e suava frio, mas firmei o pé no carpete e me encaminhei para a porta da sala de reuniões. Queriam chamar um médico mas eu nem dei atenção, provavelmente minha pressão tinha caído ou algo assim. E pensei que naquele momento o melhor seria dar uma espairecida numa casa de massagem. Mas logo mudei de idéia: quem precisa de prostitutas quando se tem Jéssica Penafiel a seus pés? Me dirigi ao camarim dela, não estava me sentindo bem mesmo, a azia começava a roer meu estômago. Fui abrindo a porta sem pedir licença e a flagrei numa situação que eu jamais conceberia, mesmo com toda minha criatividade: ela estava sentada na penteadeira urrando coisas ininteligíveis enquanto Pablo Algaz a possuía. Nem notaram minha presença. Por um momento minha visão escureceu, minhas tripas reviraram, nem sei como não desmaiei. De alguma forma consegui chegar até a porta da emissora, onde fui surpreendido pela ausência de meu importado na vaga exclusiva que possuo. Pedi explicações ao porteiro sobre meu carro e ele sorriu meio sem jeito falando que o carro era da emissora e que fora emprestado ao tal “ator menos famoso”. Não me lembro o que aconteceu depois. Aliás, a partir deste dia minha memória virou um lugar nebuloso e escuro, iluminado por clarões esparsos. Pois tudo que me recordo foi de ter tirado uma navalha do bolso e do sangue esguichando com admirável pressão, me remetendo ao Jet d’Eau, o enorme e belo chafariz que uma vez visitei em Genebra.
IV
Não sei se chegaram a filmar meu roteiro. Não sei há quanto tempo estou aqui. É um lugar simples, espartano, tudo pintado de branco, uma espécie de spa de terceira classe. Bem que eu já tinha ouvido comentários sobre a crise financeira da emissora, mas eles poderiam ter aberto um precedente para um artista da minha estirpe e me colocado num lugar onde pelo menos os hóspedes são mais civilizados. Aqui parece que só tem gente louca. Estas são as férias mais monótonas da minha vida. Quando tentei sair da área do "resort", um guarda me impediu dizendo que havia uma epidemia terrível de um vírus africano e que toda a área estava de quarentena. Não sei o que esta palavra significa, mas me remete a coisas doentias, moribundas, como hospitais psiquiátricos, então achei melhor voltar para o meu quarto naquele estranho spa onde os funcionários usam roupas brancas e os hóspedes, infames aventais azuis. Nem sei como me convenceram a vestir isso. Mas acho que com a quantidade de remédios que estão me dando, logo estarei com o físico de um Stallone e o cérebro de um Stephen Hawking, então não ligo muito. Aproveito as longas horas de inatividade escrevendo novos roteiros, documentários, novelas...mostrei alguns rascunhos para os hóspedes e eles adoraram. O da camisa-de-força, então, babou de felicidade quando ouviu a sinopse de minha nova série. Esse pessoal da emissora é sortudo mesmo em contar com um profissional que trabalha para eles até nas férias. Entrego tudo para um cara de branco que promete que vai mandar para a emissora. Até agora eles não aproveitaram nada. Digo isso porque estou assistindo eles o dia inteiro. Perguntei ao meu emissário o porquê daquilo. Ele me deu um tapinha no ombro e falou que meu trabalho era de alto nível, um nível acima do popular, por isso eles preferem exibir minhas criações na tevê paga. Ah! Então é isso! O local obviamente só tem os canais abertos. Pedi para ele gravar um dos programas para mim, mas ele se esquivou e afastou-se.
Hoje apareceu um cara aqui. Ele queria falar comigo. Fiquei feliz, ultimamente ninguém tem me procurado. Falou que era um representante da emissora e que queriam filmar minha vida. "Minha vida? Todos conhecem minha vida, a ascensão meteórica para o estrelato, meu apogeu eterno no Panteão dos Deuses da Oitava Arte...", mas ele parecia não estar prestando muita atenção, ficava só falando "sei, sei" enquanto tirava um papel da pasta. Estava cheio de escritos em letra miúda, uma espécie de lista com um espaço pontilhado no final. A leitura é um hábito inútil, uma grande perda de tempo; nunca leio nada, não ia ser naquela hora que eu ia ser diferente. Com um belo sorriso no rosto, o cara falou que era só assinar na linha pontilhada. Obedeci cordialmente, devia ser um autógrafo para o filho ou até para ele próprio. Esse meu público me ama mesmo.
FIM
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006
Piratas dos Raios Catódicos
Atlantic City é a Las Vegas da costa leste dos E.U.A. Não é preciso uma imaginação fértil para estendermos uma analogia além do covil de bucaneiros que virou uma aglomeração de cassinos. Luzes mais brilhantes... a mídia massificada, sobretudo a TV, os flashes das câmeras fotográficas. Raios catódicos que tentam padronizar nossa atitude, subornam opiniões, pilham idéias. A lógica do capitalismo selvagem possibilitou que os donos do poder não se preocupassem tanto em disfarçar suas intenções nefastas de esvaziarem nossos bolsos e espíritos. Apropriaram-se de artifícios antes restritos a uma das mais emblemáticas estirpes da marginalidade em toda a História: os piratas. Publicitários constróem faróis falsos da modernidade e nós, pobres marujos de primeira viagem, naufragamos no anúncio do carro, da cerveja, da roupa, do perfume, do cigarro, da geladeira, do celular. As luzes são tão fortes que me cegam.
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2006
Hieronymus Bosch
Hieronymus Bosch era um cara tão à frente de seu tempo que mesmo tendo vivido há cerca de cinco séculos é considerado um precursor do Movimento Surrealista. Sua obra ainda hoje é considerada obscura, enigmática, algo mórbida, carregada de simbolismos, com muitas alusões a temas como pecado e tentação. Levando em conta o fato de tais assuntos serem naturalmente relevantes em sua época, devido à onipresença do Cristianismo, o que impressiona é o fato de seu trabalho manter a atualidade. Ele parecia ter consciência de estar testemunhando um momento de mudanças, o fim da Era Medieval. Apesar de holandês, boa parte de seu acervo pode ser encontrada no Museu do Prado, em Madrid - onde é conhecido como El Bosco - inclusive o fascinante tríptico "O Jardim das Delícias". Reproduzo aqui um detalhe dessa pintura, mas é desnecessário dizer que só é possível captar toda sua genialidade vendo o original. Bosch é único e inimitável, para Jung é "o mestre do monstruoso... o descobridor do inconsciente".
terça-feira, 7 de fevereiro de 2006
Ironicamente, se eu levar esse blog adiante (já tive três e abandonei-os) vocês vão ler muita coisa sobre cinema. Fazer o quê, já nasci voyeur, o kino é minha praga e minha salvação. Desse modo acho praticamente inescapável trabalhar nessa área. E um dia talvez eu consiga captar uma fração ínfima dessa alucinação coletiva que poderia ser o sonho de uma pessoa, mas a que chamamos de realidade.
William Shakespeare (1564 - 1616), "Macbeth", Act 5 scene 5
Uma vez eu li esse trecho traduzido e foi uma coisa que ficou na minha cabeça, sempre que me sentia meio deprê eu me lembrava desta definição da vida, que a descreve como "uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, significando nada." Por que será que as pessoas mais brilhantes tendem a encarar a existência de modo tão cético e pessimista? "Ignorance is bliss"? Vejam só:
Life is something that happens when you can't get to sleep.
Fran Lebowitz (1950 - )
"A vida é o que acontece quando você não consegue dormir".
My one regret in life is that I am not someone else.
Woody Allen (1935 - )
"Meu maior arrependimento na vida é que não sou outra pessoa".
Life is a sexually transmitted disease.
"A vida é uma doença sexualmente transmissível". (genial essa, hein?)
Life is what happens to you while you're busy making other plans.
John Lennon (1940 - 1980), "Beautiful Boy"
"A vida é o que te acontece enquanto você está ocupado fazendo outros planos". ( tão legal que é citada em "Profissão de Risco", com Johnny Depp, grande filme).
Na próxima vou colocar umas abordagens mais otimistas. E a quem quer que tenha lido até aqui, obrigado pelo interesse.
Welcome!
"Sweetness, sweetness I was only joking when I said
I´d like to smash every tooth in your head."
Acho que me lembro da primeira vez que ouvi essa música dos Smiths. Eu devia ter uns 12 anos. Naquela época era fácil sonhar. Eu praticamente voava ouvindo esses caras. E graças ao massacre que sofri da indústria cultural norte-americana desde a mais tenra idade, meus sonhos eram produtos roliudianos. E consistiam basicamente de trailers, inícios ou finais de filme. A questão era - e ainda é - o que colocar entre o início e o fim. Os anos foram se passando, cada um mais rápido que o outro, e o pateta aqui vendo cada vez mais filmes, mal se dando conta que um longa metragem bem mais interessante estava permanentemente em cartaz e ele o ignorava: sua própria vida. Uma das coisas que eu mais abomino em se tratando de filmes comerciais é quando resolvem mostrar a "evolução" do protagonista em ritmo de videoclipe. O cara é um idiota, cafona, fraco e covarde e quatro minutos depois já é outra pessoa. Demorei muito até entender que a vida não é filme, parafraseando Herbert Viana.
SKA
A vida não é filme
Você não entendeu
Ninguém foi ao seu quarto
quando escureceu
Saber o que passava
No seu coração
Se o que você fazia
era certo ou não
E a mocinha se perdeu
olhando o sol se pôr
que final romântico
morrer de amor
relembrando da janela
tudo o que viveu
fingindo não ver
os erros que cometeu.
E assim tanto faz
se o herói não parecer
E daí?
Nada mais...
A vida não é filme
Você não entendeu
de todos os seus sonhos
não restou nenhum
ninguém foi ao seu quarto
quanto escureceu
e só você não viu,
Não era filme algum...