segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Ucrânia em Moçambique

Estava de bobeira navegando no IMDB, a pescoçar os fóruns sobre filmes brasileiros pra saber a opinião dos nerds d´além mar a respeito de nossa produção cinematográfica. Queria saber se conhecem algo que não seja Cidade de Deus. Um tal dyatsyuk, por exemplo, viu Meu nome não é Johnny e, apesar de ter gostado, disse que esperava algo mais "espetacular", no estilo Tropa de Elite. Diz ainda que o "governo brasileiro tem um papel muito importante no renascimento" do nosso cinema. Esse comentário me intrigou, pois pelo que sei, fora a Lei Rouanet, criada há pelo menos 10 anos, ultimamente o governo pouco tem feito pelo nosso cinema. E, particularmente, não discordo dessa postura. Só de lembrar dos tempos da Embrafilme, nos anos 70/80, quando o Estado bancava as produções brazucas, tenho calafrios. Com raras exceções, os filmes dessa época eram tenebrosos e foram responsáveis por incutir no público da época um verdadeiro asco pelo cinema brasileiro.

Mas eu falava do intrigante comentário de dyatsyuk. No rodapé da mensagem tinha um link para um blog de nome curioso: ucrania-mozambique. Isso esclarecia parte do mistério. A Ucrânia é uma ex-República Soviética e Moçambique tem um passado de revoluções socialistas. Nosso amigo com certeza viveu em lugares de forte intervenção estatal, então naturalmente presumiu que as coisas fossem semelhantes por aqui. Mesmo assim resolvi dar uma olhada no blog.

"Ucrânia em África" foi criado "em defesa dos direitos humanos & relacionamentos históricos Ucrânia-Mozambique". Achei muito legal, bem redigido, com posts interessantes e, ao contrário desse espaço aqui, tem foco, objetivo definido, uma verdadeira raison d´être. Muita coisa que foge da mídia massificada, histórias que nunca chegariam até nós se não fosse por ele.

Por exemplo: você sabia que em 14 de dezembro de 2008 foi inaugurada na Matriz de São Basílio Magno, aqui mesmo no Paraná, uma exposição sobre a Grande Fome que assolou a Ucrânia em 1932/3? Conhecida como Holodomor, a tragédia foi causada pelo tirânico regime soviético - provavelmente Stálin já estava no poder - e ceifou praticamente 10 milhões de vidas. As autoridades simplesmente confiscavam toda a comida dos camponeses, mas o post não chega a explicar os motivos para tamanha crueldade. Houve relatos de canibalismo. Eu nunca tinha ouvido falar nesse genocídio, o Politburo era um exímio acobertador de más notícias, mas hoje o governo ucraniano luta pelo reconhecimento desse triste capítulo da história do país.

E tem muito mais. Coisas de bom gosto, como a exibição de capas da revista New Yorker; e uma notícia que achei a mais bacana, pelo inusitado e pelo tom humano, chamando atenção para uma minoria que sempre sofreu com perseguições e preconceito. O título: "Ucrânia publica o primeiro abecedário cigano da Europa".

http://ucrania-mozambique.blogspot.com/

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Fragmentos Fabulosos de Filmes - Parte 1

Todo filme legal tem uma parte, uma seqûencia especialmente antológica. Comecemos pelas comédias:

- O sonho do Dude (Jeff Bridges) em O Grande Lebowski, mesclando boliche com pornografia. Ao fundo o blues My Condition
- Jim Carrey e Matthew Broderick duelando no Medieval Times em O Pentelho; Carrey improvisa a trilha sonora inspirada em filmes épicos.
- Michael Palin faz um gago tentando inutilmente proferir uma única frase a John Cleese em Um Peixe chamado Wanda. Aliás, esse flme tem uma penca de cenas memoráveis.
- Em Como Enlouquecer seu Chefe, homens de gravata destroem uma máquina de xerox em câmera lenta ao som de rap.
- O diálogo final de Quanto mais Quente Melhor: Jack Lemmon tira a peruca e diz pro velhote que estava enganando que não podem se casar, pois ele é homem. O velho nem trisca e responde: "sem problema, ninguém é perfeito".
- Mr. Garrison canta sua canção natalina na politicamente incorreta versão cinematográfica de South Park.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Jim Jones vira hype e os Evangélicos fazem cara feia

Extraordinário. Formidável. Supimpa. Num blog quase esquecido pelo próprio autor, um obscuro post escrito há mais de dois anos ganha comentários de mais de uma dúzia de internautas, um recorde. Muita gente não gostou do texto. A esses arautos de seitas evangélicas tenho o seguinte a dizer:

Em momento algum comparei a seita de Jim Jones a qualquer tipo de crença. Acho que se ofenderam com o trecho: "assim como muita sensata hoje em dia embarca na barafunda dos televangelistas, na época muitos o levaram a sério". Vivemos tempos contraditórios, com inversão de valores e tudo que isso acarreta. Como é tudo muito confuso, abraçar um pacote de dogmas pré-estabelecidos e não questioná-los parece ser a solução mais fácil, ou mesmo mais sensata. Mas sempre há um preço (além do dízimo, he, he), cada escolha é uma renúncia, e no caso seria a adoção de uma mentalidade bitolada, intolerante, que carece de empatia. Que mal há em aceitar o Deus na concepção Kardecista, por exemplo? Se alguns se identificaram com seguidores fanáticos que gradualmente foram abrindo mão de suas escolhas até não terem nenhuma, não seria hora de fazerem um exame de consciência? Obviamente ninguém seguiria Jim Jones se soubesse que no fim seria obrigado a se matar. Mas, cá entre nós, a sua igreja às vezes não induz a certos procedimentos que uma vozinha lá no fundo da sua mente diz: "será que isso está certo mesmo?"

Por outro lado, sei que Jesus foi das pessoas mais iluminadas que passaram por aqui. O problema foi a forma como usurparam e usurpam sua palavra.
Além do mais, o post pouco tem a ver com religião. Não queria discutir as opções pessoais de ninguém, mas o tom raivoso dos comentários me fez questionar essas pessoas.

Ser chamado de "repórter" afagou meu ego; na verdade sequer concluí meu curso de comunicação na PUC e trabalho como professor de línguas estrangeiras.
Houve também quem duvidasse da veracidade das informações. Quanto a isso não posso garantir nada. Minha fonte principal foi um livro chamado "Conspirações", escrito por Edson Aran. Um tipo de míni-enciclopédia muito bem humorada com verbetes como: "Nazistas pilotavam ufos", "Elba Ramalho e os ovnis" e "Paul McCartney morreu em 1966". Portanto, apesar do relato sobre o Caso Jim Jones basear-se em fontes confiáveis, não levem a história tão a sério.

Mas lembrem-se de uma coisa: o fato de algo sair na Veja, na Folha, no Jornal Nacional, no Fantástico ou na CNN não o torna uma verdade absoluta. Desconfie de tudo. Inclusive deste blog, parafraseando o Aran.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Vai um doping aí?

Olimpíadas e tal. Um achado o Millôr citar um sambinha velho (de um sambista tão genial quanto esquecido, Assis Valente) para dar uma síntese da nossa participação nesse estranho ritual - brincadeiras infantis encaradas com seriedade doentia - que são os jogos: "Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor...". Ufanismos à parte, e vai com Deus, Galvão Bueno, um aspecto das Olimpíadas que me chamou mais atenção: o duelo entre os caçadores de doping e os atletas dopados. Uma corrida bem mais interessante que a disparada do não sei quem Bolt.

O Departamento de Defesa dos EUA tem uma Agência de Projetos Avançados que corre atrás do sonho do soldado sobre-humano. Um cara capaz de correr na velocidade do Bolt nos 100 ms por 15 minutos. Ou que permaneça em combate mesmo com feridas mortais. Eles querem um exterminador do presente. Os experimentos com camundongos, que tiveram sua estrutura genética modificada para terem musculatura de atleta, já mostram que, mesmo sedentários, os roedores apresentam 30% a mais de massa muscular que seus pares comuns. Quando entraram na malhação, seus membros dobraram de tamanho. A idéia seria ajudar pacientes com distrofia muscular. Mas já imagino os ratos de academia usando esse troço...


Mas, voltando aos esportes, o próprio COI reconhece que vai sempre estar um passo atrás em matéria de tecnologia de detecção de doping. Há sempre algo novo no mercado que ajude a mascarar os traços das drogas no organismo. A era dos esteróides e anabolizantes já se foi há muito, a trapaça agora se dá por meios genéticos. Um hormônio recém-descoberto, conhecido como EPO, integra-se ao código genético do atleta, tornando-se indetectável.

O que se vê então é uma atmosfera tipo inquisição espanhola. Atletas célebres das mais diferentes modalidades têm seus feitos frequentemente questionados, muitas vezes com razão. Andrei Markovits, professor de política comparativa da Universidade de Michigan, foi enfático: "O cara toma Viagra, antidepressivo, ansiolítico, remédio pra concentrar, pra desconcentrar... só o atleta não pode. E por quê? Devido ao ultrapassado ideal de amadorismo e virtude no esporte - conceitos desenvolvidos pela classe dominante inglesa de Oxford e Cambridge, no século XIX."

A solução para ele seria permitir que todo atleta adulto e sadio tivesse acesso a qualquer substância que julgasse útil, desde que tudo fosse feito através de médicos responsáveis. Não haveria mais esse véu sobre o doping. Ele só faz uma excessão quanto a atletas mais jovens.
Um outro figura vai além. O bicampeão olímpico de esqui alpino, Bode (?) Miller, vaticina: "Não é uma luta do bem contra o mal. Trata-se de igualdade de condições. Se pode tudo, ok. Senão pode nada, ok também. Mas a realidade é que os controles não resultam em igualdade. Quem quer se dopar e passar despercebido tem grandes chances de conseguir." Mandou bem.

Marion Jones perdeu as 5 medalhas amealhadas em Sidney em 2007, num dos casos mais vergonhosos da história olímpica. O embaraço aumentou quando descobriu-se que a segunda colocada em uma das provas também competiu dopada. O pódio tinha era que ficar vazio...

Entramos numa esfera mais ampla. A sociedade endossa a cultura do desempenho. Que seria da civilização ocidental pós-guerra se não fossem as drogas? E me refiro apenas às lícitas - com as ilícitas o papo é outro. Idosos e enfermos se mantêm vivos graças a elas. Se seus avós ou pais de repente ficaram mais felizes, quem sabe não tem o dedo do viagra aí? Quantos milhões de pessoas não recorrem a um lexotan senão não dormem? Então porque o Lance Armstrong não pode tomar umas bolinhas para subir os alpes numa bike mais rapidinho? Stallone só fez o Rocky Balboa aos 61 anos graças ao hormônio de crescimento, o HGH, que, segundo ele, em 10 anos será vendido em farmácias sem receita médica.

Além disso, se há drogas que estimulam o desempenho físico, há também aquelas que dão uma ligadinha nos neurônios. O campeão de poker Paul Phillips usa remédios contra narcolepsia e outro contra distúrbio de déficit de atenção; já ganhou US$2,3 milhões. Integrantes de orquestras tomam beta-bloqueadores, pilotos de avião têm seu aparato e qual estudante nunca tomou um rebite na véspera da prova?

Você, que é jornalista, professor, advogado, sei lá, tomaria uma droga prescrita por um médico que fosse capaz de torná-lo mais eficiente, mais produtivo, ou mesmo mais lúcido? Quem não compraria a pílula da memória?


Por outro lado, toda substância que ingerimos que de alguma forma altera nossas funções vitais não estaria nos afastando do que somos fundamentalmente, com qualidades e defeitos e todas as idiossincrasias? Os antigos não tinham vidas melhores que as nossas sem toda essa porcariada? Francamente, essa idéia, além de utópica, vai na contra-mão da história. Concordo que o arsenal de substâncias que os laboratórios colocam à nossa disposição é exagerado, inconsequente, muitas vezes supérfluo. Junto com os alimentos modificados que ingerimos e o ar poluído que respiramos, continuamos evoluindo, só que - do mesmo jeito que estamos fazendo com o planeta - numa velocidade muito mais rápida. Como serão nossos netos e bisnetos? Criaturas mais capazes, com vidas mais longas e proveitosas, graças às drogas? Ou se aproximariam de autômatos, supereficientes, mas desconectados de suas emoções? O eterno Deus Mu dança...

Obs: agradeço à Piauí de agosto, pelo menos meio post veio dela.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Dandelion

Quando sua segunda filha nasceu, Keith Richards batizou-a "Dandelion". Ela mudou seu nome assim que pôde para "Angela"


Prince or pauper, beggar man or thief
Play the game with every flower you bring
Dandelion don't tell no lies
Dandelion will make you wise
Tell me if she laughs or cries
Blow away dandelion

One o'clock, two o'clock three o'clock, four o'clock chimes
Dandelions don't care about the time
Dandelion don't tell no lies
Dandelion will make you wise
Tell me if she laughs or cries
Blow away dandelion, blow away dandelion

Though you're older now it's just the same
You can play this dandelion game
When you're finished with your childlke prayers
Well, you know you should wear it

Tinker, tailor, soldier, sailors lives
Rich man, poor man, beautiful, daughters wives
Dandelion don't tell no lies
Dandelion will make you wise
Tell me if she laughs or cries
Blow away dandelion, blow away dandelion

Little girls and boys come out to play
Bring your dandelions to blow away
Dandelion don't tell no lies
Dandelion will make you wise
Tell me if she laughs or cries
Blow away dandelion, blow away dandelion

Charles Wish


Já tinha muito tempo que eu eu não achava um artista plástico legal na web. Aí o stumble me vem com um mais ou menos no estilo dos caras que já publiquei, como o Yerka. Mas mais doido ainda. O cara mescla cultura pop, igreja, o american way of life e erotismo numa embalagem onírica, ou perturbardora, se preferir. Não vá julgando à primeira vista, a reação inicial remete a morbidez e perversidade, contudo, o tal Charles Wish é cuidadoso, detalhista. Tem coisas que se parecem com polaróides do inconsciente.


Vejo uma vontade de romper convenções: a garota de piercing chupa um picolé ligado por um fio ao carrinho do sorveteiro, que parece pertencer a um homem-elefante. Seria uma referência ao filme de David Lynch?


As imagens mereciam estar num tamanho maior. Repare no simbolismo da moldura da janela: um triângulo invertido, dentro de um quadrado, dentro de um octógono. No telhado, o boneco de um fauno(?).

Essa eu acho que o Jabor ia gostar. Bin Laden é Cristo, e parece estar prestes a ser esmagado por um trator; o ás de espadas na cruz, o verdadeiro Cristo dá a impressão de ser o condutor, segurando o rabo do diabo (???). O anjinho Tio Sam observa. E por aí vai. Estou achando esses comentários meus supérfluos e idiotas.

Dentre as que mostrei é a minha favorita. Não, não é por causada mulher pelada, várias outras que descartei também têm. O belo tom do céu com nuvens espiraladas. Um John Wayne comendo pipoca enquanto ouve conselhos de um anjo. O símbolo do feminino ao fundo.

Wish nasceu em 1971. Estudou religiões orientais, com ênfase em budismo tântrico, seitas indianas e filosofia hindu, chegando a morar num monastério. Simultaneamente, era fascinado com pintores regionalistas americanos, como Grant Wood - autor do célebre American Gothic:


Agora, a paródia, ou tributo, de Charles Wish:


Como diz a biografia dele, num mundo onde as barreiras culturais foram demolidas, Wish se utiliza de uma realidade onde cada cultura foi afetada e alterada por influências externas, e que para a Humanidade encontrar seu território em comum (com o outro e consigo mesmo) é necessário harmonizar essas múltiplas culturas para enfim criar sua própria individualidade a partir de um repositório infinito de possibilidades. Ficou confuso? No original está melhor.

A biografia vai mais além. As visões de Deusas Tântricas associadas a paisagens rurais, apesar de parecerem opostas, na ótica de Wish se complementam: os temas orientais trazem mistério e possibilidades infinitas, o provincianismo remete à preservação da cultura e tradições locais. O efeito, tanto no artista quanto no espectador resulta numa abordagem inclusiva, em busca da quintessência - esse termo não consta no original, mas achei que caía bem - das coisas até chegarmos aonde "resta apenas o divino".

Wish está vivo, casado, mora na Califórnia e aos poucos está ganhando notoriedade. Um crítico classificou seu estilo como "surregionalismo".

Alguém gostou? Achei que seria um prato cheio pra quem se liga nessas coisas de inconsciente, semiótica e mais uma porção de assuntos impertinentes. Dá até pra brincar de "ache a referência". Tem mais um monte em: http://www.charleswish.com/index.htm
Enjoy.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Fuck You





I. Fuck na História, fuck na TV
, fuck a política

É comum na língua inglesa o som das palavras se parecer com seu significado, como splash (molhar) ou crash (colidir). Fuck não é exatamente uma onomatopéia, mas o som da palavra - simples, conciso, direto, algo agressivo - combina com o que ela representa. É até gostoso de falar.

Pois eu e os norte-americanos temos uma tendência de voltar nossa atenção para coisas pouco importantes, como a questão do banimento de uma palavra do léxico de toda uma língua. Os defensores da idéia são os mesmos wasps, republicanos e intolerantes em geral. Mas sempre tem algum cabeludo pegando no pé deles, graças a Deus. Veja você: fizeram um documentário inteiramente dedicado a essa polêmica palavrinha de 4 letras. De onde ela veio? É lícito proferi-la na TV? E em casa? Se falar Deus castiga? (Êta falta do que fazer... protesta meu ombudsman.)

A origem do vocábulo é controversa. Se você já ouviu de algum sabichão que fuck é um acrônimo de "Fornication Under Consent of the King", uma plaquinha que as autoridades afixavam na porta da casa de algumas famílias na Inglaterra medieval, permitindo a prática do sexo, saiba que essa historinha foi inventada pela Playboy nos anos 70. Na verdade ninguém sabe de onde veio. Um cara até falou que foi a primeira palavra da língua ancestral que veio a se tornar o inglês. Pode até ser, visto que além de seu significado original, a palavra pode ser empregada de várias outras maneiras, como o nosso "que merda!" (what a fuck!) ou "cadê a porra da chave?" (where is the fucking key?).

Numa sociedade repressora e paranóica como a americana, criou-se uma grande celeuma em torno do emprego da palavra nos meios de comunicação de massa, polarizando opiniões e inflamando debates. Fuck é, talvez, o único palavrão "espacial", pois já foi à Lua através de um comentário do astronauta Buzz Aldrin e mesmo o grande guardião do conservadorismo americano, o Presidente Bush, já a proferiu na frente das câmeras. Ainda assim, fuck permanece um tabu nas TVs abertas do Tio Sam. Podia ser pior, não fosse a audácia de bravos desbocados, como o stand up comedian - humorista tipicamente americano que entretém a platéia sozinho em bares e night clubs - Lenny Bruce. Foi preso 5 vezes por falar fuck em seu show. Eram shows fechados, para maiores de 18. Se Lenny não tivesse existido, teria que ser inventado. Foi ele quem peitou os juízes e insistiu em seu direito de livre expressão garantido pela Constituição. Afinal, gritar fuck ou foda-se não deixa de ser um ato de libertação.

Foda-se: o definitivo caminho espiritual


Eram tempos conturbados. Soldados americanos voltando do Vietnã em body bags, ou crianças vietnamitas derretendo com napalm pareciam ser menos obscenos que dizer fuck.

Acho que aqueles que são contra o fuck estão confundindo lei com moralidade. Em 2003 Bono Vox falou fuck em seu discurso de agradecimento pelo globo de ouro, ao vivo, para milhões. A imprensa marrom de sempre viu aí uma polêmica rentável; e cobrou-se das autoridades uma explicação. Fala palavrão na tv e sai ileso? O governo argumentou que naquele caso a palavra não estava sendo usada num sentido obsceno. Mas uma tal comissão de pais em defesa da moral e bons costumes, ou algo assim - republicanos de ultra-direita - fez as autoridades voltarem atrás e condenarem publicamente a fala de de Bono, além de multá-lo. Enquanto isso, na Noruega, uma banda hardcore promove sessões de sexo explícito em seus concertos a fim de chamar a atenção para o aquecimento global. Faz sentido.

Será que as criancinhas, que se arrependem amargamente por terem dito fuck, temendo um castigo divino, teriam alguma razão? A pergunta soa tola e infantil, mas tem muito cristão fanático que acha que sim. Tavez porque Deus seja uma entidade assexuada, não há uma "Sra. Deus". Então se ele não fode, provavelmente não se sente à vontade com a palavra que ele é incapaz de praticar.

"Se o Presidente não pratica a "f-word" com a esposa, fatalmente o fará com o país."
Mel Brooks

O supra-sumo da hipocrisia ocorreu quando o vice do Bush, Dick Cheney, falou fuck yourself a um senador democrata, em pleno Congresso, os "paladinos da moral" não deram um pio.


II. Fuck na Família e o que há por trás disso

Uma das maiores catástrofes que pode ocorrer numa típica família ianque é o filho menor aprender a palavra fuck. Em sua visão paranóico-fatalista, seria o primeiro passo para uma vida de crime, vício, imoralidade, vergonha etc. Dizem que essas mesmas famílias não querem ouvir palavras de baixo calão nos filmes, mas uma baboseira intitulada "Meet the Fockers" fez um sucesso estrondoso.

Cartaz do doc

Tudo isso, ou quase tudo, vem de um documentário que vi na HBO. Cultura inútil total, mas bem dirigido, com depoimentos interessantes. E é dedicado a meu ídolo Hunter S. Thompson, o criador do gonzo journalism, que mescla o objetivo com o subjetivo,vai além da simples notícia, tem toques literários, é sarcástico, irreverente, por vezes narra as histórias em primeira pessoa; entre estilo e precisão, prefere o primeiro. No depoimento que ele presta no doc, mostra-se preocupado com os rumos que a política e a sociedade americana estão tomando. A multa para quem disser fuck na tv aumentou em 10 vezes. Alguns congressistas lutam para estender a proibição para a tv paga. O radialista Howard Stern, conhecido por sua total falta de vergonha e posturas liberais, foi obrigado a transmitir seu programa via satélite para acabar com a perseguição constante que sofria, inviabilizando seu trabalho. Felizmente, a censura ainda não chegou ao espaço.

O pior de tudo não é a força e a intensidade da onda conservadora que tornou os americanos ainda mais intolerantes, arrogantes, moralistas e bitolados. O problema é a politização dos parâmetros que regulam o uso da palavra. Por exemplo: "fuck Iraq" ou "fuck the muslims" têm mais chances de passarem batido que "fuck the president" ou "fuck the american way of life", ou ainda "fuck the Cadillacs". Menos de um ano depois que Bono falou seu fuck, exibiram na tv aberta "O Resgate do Soldado Ryan". Há 21 fucks no filme. A FCC (Federal Communications Commission) a agência estatal que dita o que pode e o que não pode passar na tv, não considerou sequer um fuck ofensivo, o filme passou sem cortes.

Antes de adotar uma postura repressora em questões que envolvam liberdades individuais, não podemos nos esquecer que o que já foi tabu no passado, como a mulher desquitada buscar um novo amor ou a igualdade de raças são fatos inquestionáveis hoje em dia. Quem lutou por esses direitos hoje luta por mais liberdade nos meios de comunicação de massa. Como disse Voltaire:

"Posso não concordar com uma só palavra que você disse, mas lutarei até a morte pelo seu direito de expressá-la.
" Ou algo parecido.

A questão do tal "livre-arbítrio" é espinhosa. O leitor(a) pode me botar contra a a parede: seria "liberal" permitir que pessoas alcoolizadas conduzam veículos ou apenas estupidez?

O fato é que por trás da polêmica do fuck, a pergunta fundamental é: a Humanidade já é madura o suficiente pra que se permita que cada um exerça de forma incondicional seu livre-arbítrio? Infelizmente, é óbvio que não. Ainda somos a mesma criança amedrontada de milhares de anos atrás. Uma criança que teme, acima de tudo, a si mesma, e que por isso ainda se apega às leis mais primitivas, como o vergonhoso "olho por olho" de Hammurabi. Parece que somos o pai de nós mesmos repetindo: tire os cotovelos da mesa, mastigue de boca fechada e não fale palavrão. Tememos um castigo. Qual seria ele?

terça-feira, 17 de junho de 2008

Figuras a esmo





The Cat Inside

Tigrinha

50 dias sem nem olhar o blog. E, de repente, me deu vontade de escrever um post. Botem a culpa nos gatos. E em William Burroughs. Chique no úrtimo, hein? Já devo ter falado desse cara antes, mas ele merece ser relembrado.

Burroughs é um ícone da geração beat. Tudo bem, mas o que é beat? Boa pergunta. O termo foi tão manipulado ao longo das transformações sociais ocorridas nas últimas décadas que ficou difícil defini-lo. Vou tentar pelo início. No final dos anos 40, Jack Kerouac e Neal Cassady botaram o pé na estrada e cruzaram os EUA de carona embalados por jazz e bebedeiras. Daí saiu um manuscrito redigido numa folha de bobina ou algo parecido, com 36 ms de comprimento. On the Road, um romance de formação marginal - no sentido de estar à margem - um exercício de liberdade e desapego, a semente da contracultura. Ser beat significava, na concepção de Kerouac, buscar crescimento espiritual através da assimilação de culturas e religiões diferentes. Guiar-se, acima de tudo, por sua consciência e expandi-la ao máximo, inclusive através de drogas, abraçar valores como espontaneidade e inconformismo; desprezar a indústria cultural e o materialismo. Ter uma visão de mundo libertária, tolerante, livre de preconceitos. A expressão foi tirada de uma gíria do submundo que significa "surrado", "detonado", em suma: de mal a pior. Mas para Kerouac definia uma postura de estar por baixo, no fundo, mas com a visão voltada para o alto, o topo. Daí sua semelhança com o termo "beatífico".

Cá entre nós, tudo muito virtuoso, mas vovó já dizia que esse tipo de coisa costuma dar em merda.

Mas para a opinião pública, beat eram jovens boêmios hedonistas, despudorados e rebeldes. Logo surgiu o termo "beatnik", uma forma pejorativa de se referir à turma de Kerouac, Allen Ginsberg, Cassady e Burroughs. E, como era de se esperar, a mídia e o sistema capitalista se apropriaram da palavra e a distorceram da forma que pudessem lucrar mais com ela. Mesmo assim, teve grande influência sobre movimentos posteriores, como os hippies e os punks.

De vanguarda a estereótipo

Entre os precursores do movimento, Burroughs foi um dos que mergulhou mais fundo em sua própria filosofia. Sua bissexualidade e tendência à drogadição manifestaram-se desde a adolescência. Graduou-se em Harvard, passou uma temporada na Europa e quando regressou o ataque a Pearl Harbor tinha acabado de acontecer. Quis alistar-se, mas seu passado de instabilidade mental relegou-o à posição de recruta, o que o deixou muito deprimido. Serviu o exército por alguns meses, nunca deixou seu quartel. Em 1944 mudou-se para um apartamento com Kerouac, sua esposa e Joan Vollmer, com quem veio a se casar. Nessa época começou a usar morfina e logo se viciou, tornando-se traficante para manter o vício. Sua esposa também passou a usar drogas, problemas com a lei eventualmente surgiram. Tiveram que fugir para o México. Em 1951 matou Joan com um tiro na cabeça enquanto brincavam de "Guilherme Tell": ele tinha que atirar numa maçã na cabeça da esposa com uma arma de fogo, completamente bêbado.

Burroughs e Kerouac

Segundo Burroughs, esse evento marcou seu nascimento como escritor. A morte de Joan apresentou-o ao invasor, o Espírito Horrendo, que só podia ser confrontado através da liberação do fluxo de consciência através da escrita. Entendeu? Nem eu. Mas Burroughs não é pra ser entendido. E suas peripécias estavam apenas começando.

E o que os gatos têm a ver com isso tudo? Na próxima. Mas não pude evitar a publicação de uma foto da Tigrinha, filha da segunda prole de Branquinha - em breve apresentarei todo o clã felino.

sábado, 26 de abril de 2008

O Caminho do Guerreiro Pacífico - Atualizado

Esta história não é de minha autoria. Vem de um filme, adaptação do livro que intitula este post.


Capítulo I


Ok, você é jovem, bonito, exímio na ginástica olímpica, popular, família rica, aluno exemplar. Sente que o mundo inteiro cabe em suas mãos. Então porque não dorme à noite? Vai saber... Fica perambulando pela madrugada, passa numa loja de conveniência e compra um gatorade - você também não tem vícios. O frentista, um velho barbudo, usando um sapato de cada cor, do nada faz algo fora do comum que chama sua atenção, mais que isso, te instiga, como se você tivesse que provar alguma coisa a ele. Muito estranho, se compararmos suas posições na pirâmide social, ou mais exatamente, na cadeia alimentar. Você é um grande felino, ele, no máximo um roedor. Os atletas mais completos são os ginastas. Ele te fala dos guerreiros espartanos de elite, cujo treinamento envolvia saltar sobre touros, sabia disso?
"Sei mais do que você imagina", é sua resposta.
Com ares de filósofo, ele retruca:
"Imagina mais do que sabe. Conhecimento não é o mesmo que sabedoria".
Que velho atrevido, que chavão mais surrado!
"É mesmo? Qual a diferença?" Sua voz não esconde a irritação.
"Sabe limpar um pára-brisa?" E ele atira uma bucha pra você. Ele está abastecendo um carro e você esfrega a bucha no vidro, sem pensar naquilo. "Sabedoria é agir."

"Sabedoria é agir"... ele deve ter visto isso naquele filme caça-níquel O Segredo. Mas você volta pra casa pensando naquilo.



Capítulo II


Ao dormir na noite seguinte com uma modelo aspirante a atriz ruiva e siliconada, sonha que está praticando nas argolas quando cai e sua perna se esfacela em pedaços. Um servente varre os caquinhos. Ele usa os mesmos sapatos do frentista.

Deixa a ruiva sem entender nada. Aquilo te impele para o posto:
"Porque usa um sapato diferente do outro? É uma moda nova entre os proletas?"
Ele não se abate com o comentário preconceituoso:
"Acidentei-me quando praticava."
Você o estuda. Parece emanar uma confiança inquebrantável, uma serenidade à toda prova. Quer diminuí-lo:
"Sabe que um dia você pode sair no Fantástico? 'O frentista que virou guru de auto-ajuda'. Já estou até imaginando o Cid Moreira narrando."
Ele te lança um olhar com tamanha piedade que você continua:
"Treino 7 dias por semana. 50 semanas por ano!"
"Pra quê?"
"Cê tá brincando, né? Estou prestes a conseguir a classificação." Você reforça a última palavra, pra calar a boca dele de vez. Mas isso é impossível:
"Classificação pra quê?"
"Acompanha as Olimpíadas?"
"Não."
Que lunático... ainda assim como ele coseguiu fazer aquilo que te impressionou tanto?
"Olha, mesmo sendo bom, tenho que dar o melhor de mim pra conseguir minha classificação para os Jogos Olímpicos."
"Você ainda precisa aprender muita coisa pra entender o que acabou de ver."

É verdade. Mas é claro que você não dá o braço a torcer:
"Então me teste. Faça uma pergunta. Qualquer uma. Manda ver, sem dó".

Pausa. Ele está debruçado sobre o motor de um Chevette que já devia estar no ferro-velho há anos. Ergue a cabeça e te encara:
"Você é feliz?"

Putaquepariu. Mais uma vez ele te desconcerta. Você é inundado por duas sensações quase conflituosas. O fascínio da criança ao ver o mágico tirando o coelho da cartola, e a vergonha raivosa que te apossou quando foi flagrado pela professora com uma revista pornô em frente de toda a classe. Sem se dar conta, você fica olhando pra ele de boca aberta, tirando e botando a mão no bolso. Não tem resposta para aquilo. Com o silêncio, ele volta a te olhar:
"Disse que eu podia perguntar qualquer coisa."
"O que felicidade tem a ver com isso?"
"Tudo."
E você passa a desfiar o rosário de maravilhas que é sua vida. Grana, notas altas, popularidade, garotas, sua moto Triumph de 800 cc, sua quase certeza de participar das Olimpíadas etc.
"Então porque não dorme à noite? Que está fazendo aqui mais uma vez se exasperando com um frentista às 3 da manhã?"

E mais uma vez ele está certo:
"Quem é você, o filósofo do posto Shell?"
"Precisa de filosofia?"
"Não, valeu, Platão, já tenho o suficiente na faculdade." Você diz isso já de saída, dando um esbarrão proposital nele. Babaca.

"Última pergunta, ginasta olímpico. Suponhamos que não seja classificado. O que você faria?"
(continua)

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Ateu Attacks!

Brasileiro adora igreja. Enquanto ouvia agora há pouco um homem histérico berrando e cantando músicas medonhas num templo crente pensei numa coisa. Se um ET desembarcasse na Terra afim de pesquisar objetos de nossa devoção, sua descrição do Cristianismo seria mais ou menos assim:

Crença em um zumbi judeu cósmico que é o pai de si mesmo e te dará vida eterna se você comer sua "carne" e telepaticamente contar a ele que você o aceita como seu mestre; para que então ele possa remover de sua alma uma força maléfica que está presente na Humanidade porque uma mulher feita de uma costela foi convencida por uma cobra falante a morder um fruto de uma árvore mágica.

Faz sentido!

terça-feira, 15 de abril de 2008

O Caminho do Guerreiro Pacífico

Esta história não é de minha autoria. Vem de um filme, adaptação do livro que intitula este post.

Ok, você é jovem, bonito, atlético, popular, família rica, aluno exemplar. Sente que o mundo inteiro cabe em suas mãos. Então porque não dorme à noite? Vai saber... Fica perambulando pela madrugada, passa numa loja de conveniência e compra um gatorade - você também não tem vícios. O frentista, um velho barbudo, do nada faz algo fora do comum que chama sua atenção, mais que isso, te instiga, como se você tivesse que provar alguma coisa a ele. Muito estranho, se compararmos suas posições na pirâmide social, ou mais exatamente, na cadeia alimentar. Você é um grande felino, ele, no máximo um roedor. Ele te fala dos guerreiros espartanos de elite, cujo treinamento envolvia saltar sobre touros, sabia disso? "Sei mais do que você imagina", é sua resposta. Com ares de filósofo, ele retruca: "Imagina mais do que sabe. Conhecimento não é o mesmo que sabedoria". Que velho atrevido, que chavão mais surrado! "É mesmo? Qual a diferença?" Sua voz não esconde a irritação. "Sabe limpar um pára-brisa?" e ele atira uma bucha pra você. Ele está abastecendo um carro e você esfrega a bucha no vidro, sem pensar naquilo. "Sabedoria é agir."
(continua)


Continua nada. A partir daí o filme descamba para a americanofilia - nem sei se a palavra existe -
resvalando nos clichês de superação pessoal inverossímil, o mestre que acaba aprendendo com o discípulo, essas baboseiras de sempre. Nick Nolte está desperdiçado como o Yoda da Texaco. Mas os extras informam que é baseado em uma história real, um paraplégico que... ah, nem vale a pena contar.

Do the Evolution

Houve uma época, há muito menos tempo que parece, que o videoclipe era o supra-sumo da modernidade. Ir na casa de um amigo e ficar vendo aqueles filminhos toscos e cafonas dos anos 80 era super "in", como se falava, ou em português atualizado, o hype. Céus, estou falando como minha avó! "No meu tempo"..., "a gíria da época", "não se usava fazer isso"... São expressões típicas de quem julga pertencer a outro tempo, nostálgico. Pois é. No meu tempo o Michael Jackson ainda era um ser humano e amarrava-se cachorro com linguiça. Ha ha ha...

Michael does the evolution

Foi esse cara, hoje tido como aberração da natureza, que revolucionou não só a dança, mas toda a indústria da música. Antes do MJ havia o pop e o rock. Esses gêneros não se misturavam, da mesma forma que nos EUA havia as rádios de brancos e as rádios de negros. Depois que Jacko fez seu passo de dança moonwalk num show em maio de 83 o mundo nunca mais foi o mesmo. A partir daí ele foi rompendo um tabu após o outro (pena que alguns tabus não são exatamente motivo de orgulho), recorde sobre recorde. Em dezembro do mesmo ano ele se juntou ao diretor John Landis para mais uma revolução, desta vez com um clipe, Thriller. E os clipes ganharam um status que não tinham até então.

Se não fosse MJ, nunca teríamos obras espetaculares como Do the Evolution, uma animação soberba em cima de uma canção do Pearl Jam. Você já deve ter visto, está em toda seleção de "melhores clipes". Mas vale o registro. Além do mais, acho que me saio melhor quando não escrevo besteira. O desenho é tipo uma versão enxuta de The Wall, atualizada pros anos 90. O traço do Todd McFarlane (das HQs Spawn) se adequa perfeitamente ao tom contestador, pessimista, incisivo, da letra, um resumo da história de nosso planeta, mais que isso, um mea culpa da raça humana, chegando a ser quase profético, visto que data de mais de 10 anos atrás. Influenciou muita coisa que veio depois, como Matrix. A manipulação das massas através da religião, a banalização da violência, o endeusamento da brutalidade e da alienação, os saltos tecnológicos que paradoxalmente nos desumanizaram ainda mais, gradualmente privando a singularidade de cada um. Máquinas cada vez mais parecidas com pessoas e vice-versa. O demônio personificado por uma gatinha irresistível. Um bebê brincando com um 38 carregado, acho que essa seria a síntese. E a música é rock´n roll da melhor estirpe, espécime cada vez mais raro. Confira aqui. Tentei copiar e colar a letra de vários sites, mas sempre vinha desconfigurado. Mas você pode ver aqui. Depois traduzo.

domingo, 13 de abril de 2008

China: Terra de Contrastes

As Olimpíadas de Pequim, somadas ao boom econômico, fizeram o mundo voltar sua atenção para a China. O fato de se situar do outro lado do globo, tratando-se de uma cultura tão antiga quanto peculiar, e somado a um regime político que tenta isolar seu povo o máximo possível do resto do planeta, nos leva a cultivarmos estereótipos muitas vezes equivocados. Talvez os chineses não sejam tão diferentes de nós quanto pensamos. Talvez sejam mais.

Munido desse espírito desmistificador, e com o apoio imprescindível da Superinteressante desse mês, pincei alguns fatos que podem lançar uma luz nesse mistério chamado China. Vou além dos filés de cachorro, pastelarias, tinturarias, Bruce Lee, bens de consumo baratos e ordinários e daquele chapéu engraçado dos plantadores de arroz. Mas não vá esperando um tratado acadêmico: vou falar de cultura, mas daquela que não tem serventia alguma.

- O Governo Chinês, uma das ditaduras mais duras de nossos tempos, merece letras maiúsculas, afinal, ele controla tudo, estando inclusive acima de Deus. Aliás, que Deus? O camarada Mao? Os lamas tibetanos, por exemplo, estão proibidos de ressuscitar sem a autorização do Estado. Os tentáculos do Partido Comunista, que é a mesma coisa que o Governo, controlam ainda a internet - são 30.000 censores só pra web - a religião - há católicos, mas eles não podem reconhecer o Papa como seu líder e padres e bispos precisam passar pelo crivo do PC antes de serem ordenados; a tv, é claro, e até mesmo os relógios. Devia haver 4 fusos horários na China, mas o Governo falou que a hora que vale é a de Pequim e não se discute.

- Mas não se discute mesmo: o Congresso se reúne apenas uma vez por ano. Toda forma de oposição ao PC é tratada como "ameaça ao regime", passível, no mínimo, de prisão. Aliás, há cerca de 100 jornalistas e blogueiros presos atualmente.

- Contudo, o tal mito de que nas execuções a família do morto paga pela bala é impreciso: ela também tem que arcar com o funeral, mas as flores são cortesia do PC.

- O chinês e o sexo: filme pornô é proibido. Um casal que via um vídeo erótico foi denunciado pelo vizinho. A polícia veio, encarcerou-os, confiscou o vídeo e a fita. Mas mesmo lá os ventos liberais já sopram: uma campanha (anônima, é claro) pela internet pedindo sua libertação resultou em sua soltura. O fanatismo da censura gera anomalias como uma estatística que diz que 77% dos chineses não sabem que a AIDS pode ser evitada com o uso da camisinha. E a maioria dos homens só perde a virgindade aos 23 anos. O aborto é permitido, por isso só 2% das chinesas casadas tomam pílulas anticoncepcionais. Homossexualismo é caso de polícia. Paradoxalmente, agências de escort girls são permitidas. No entanto, as garotas não fazem sexo, apenas conversam com clientes pouco afeitos a colóquios com o sexo oposto.

- Um grande evento esportivo são as Olimpíadas Suínas. As provas incluem corrida, natação, velocidade ao comer, simpatia e conhecimentos gerais. No ano passado o vencedor foi um atleta de 1040 quilos extremamente cortês e afável, por sinal.

- A cada feriado do Ano-Novo, mais de 300 milhões de chineses viajam pelo país para se juntarem a suas famílias. Com trens superlotados e sem banheiros, muitos se previnem usando fraldas geriátricas.

- Ah, sim, não podia esquecer da dieta do chinês. Basicamente, eles comem tudo que se move. Qualquer bicho que você pensar. Mesmo. Se for a Pequim, não deixe de visitar o restaurante Guolizhuang, especializado numa certa parte da anatomia de animais como touro, jumento, cão, carneiro, cobra e foca. Apenas os machos, é óbvio.

- Um pequeno conto macabro. Diz uma lenda que se um homem morrer sem se casar, sua linhagem estará comprometida em sua próxima encarnação. Caso esse infortúnio aconteça, sua família trata de matar ou mandar matar uma jovem para ser enterrada com ele e assim casarem-se no pós-morte, livrando-se da maldição. No ano passado, uma quadrilha especializada em conseguir "noivas cadáveres" foi presa.

- Para não me acusarem de implicância: o próprio Governo instituiu o Comitê de Orientação Espiritual Civilizadora. Os chineses são orientados a não escarrarem em público, não jogarem lixo na rua, respeitarem áreas de não-fumantes, falarem mais baixo em público (eles gostam de conversar aos berros), não agacharem na rua (?) e lavarem as mãos de vez em quando.

Pensando bem, o Lula devia implantar esse comitê aqui.

domingo, 16 de março de 2008

Metal - Parte 1

Não, não sou metaleiro. Talvez tenho esboçado alguma identificação com headbangers em minha adolescência tardia, já mais próximo dos 20 anos, naquela fase quando o mundo se abre pra você como uma cornucópia de maravilhas. Me aplicaram no Iron Maiden, achei pesado demais, com o tempo acabei gostando. Depois, num impressionante processo de expansão da consciência, tomei conhecimento do Led, Deep Purple, Sabbath, Cream (considera este heavy?). Minha trajetória musical é um tanto incomum. Quando criança, nada de Balão Mágico, Xuxa ou Menudo (se você nasceu depois dessa era paleolítica, a grosso modo esse povo hoje corresponde respectivamente ao High School Musical, alguma loura gostosa da vez, tipo Kelly Key ou Britney Spears e o grupo RBD, se não me engano). Acho que eu era uma versão mineira do geek ou nerd, pois aos 10 anos colecionava discos do Milton Nascimento e Beto Guedes. E ainda passava horas elaborando rankings altamente criteriosos das melhores músicas deles, divididos em categorias como letra, arranjo e "quociente emocional", a capacidade da música te arrepiar. No topo tinha Travessia, Nos Bailes da Vida, Para Lennon e McCartney, Canção da América e Feira Moderna (essa do Beto) Tinha certeza absoluta que me tornaria um escritor de grande sucesso, meu ídolo era o L.F. Verissimo.

Na mesma época - lembre-se, com 10 anos, meu pai me levou - fui no Rock in Rio I. Sim, o primeiro, legendário, com AC/DC, Iron Maiden, Whitesnake, Ozzy, Scorpions. Era a fse de ouro do Metal. E eu era tão cdf que odiava essas bandas e preferi ir no dia do George Benson e James Taylor.


Tsc, tsc. Ainda vou construir uma máquina do tempo para voltar a janeiro de 85 e corrigir essa cagada.


Assim como a maior parte do mundo, eu também discriminava os metaleiros. Satanistas, hedonistas, incompetentes, marginais etc. Não entendia como meus amigos podiam gostar daquilo e mesmo esses sequer tinham uma pálida idéia do que Satanismo realmente se trata. Na verdade, eu ainda não estava pronto. Pois metal está ligado à força, liberdade, questionamentos como: onde foi parar minha rebeldia, meu desejo de não compactuar com uma sociedade hipócrita? Como amadurecer sem deixar de ser fiel a mim mesmo? Como ser idealista num mundo onde as instituições que julgavam-se guardiãs da moral estão em colapso? A civilização ocidental e seus líderes já não oferecem mais escolhas, ou você entra no ritmo deles ou será rotulado como "doidão".
Se você deixar de lado mitos como o Ozzy comendo pintinhos, adoração ao Demo, promiscuidade, drogas e tudo mais, verá que a tribo dos metaleiros é um dos poucos portos seguros que um garoto com "problemas de adaptação" tem para se agarrar. Ainda tem muita gente que crê que de fato eles adoravam o Belzebu, o diabinho chifrudo com pés de cabra. Meus amigos gostavam do peso da guitarra e títulos como Suicide Solution, mas o metal vai muito além de notícias de tablóide e provocações. Aliás, recomendo o documentário Metal para todos que tiverem esses preconceitos. E prá quem não tem.


Pois o Heavy Metal também pode ser uma ferramenta de auto-conhecimento, ou mesmo auto-preservação desses adolescentes marginalizados. Há uma relação quase mística entre os músicos e os fãs. Em geral e, sobretudo no início da febre, tinham a mesma origem humilde, crescendo em bairros violentos, repletos de drogas e ignorados pelo Estado. Ironicamente, músicas execradas por entidades de direita nos EUA, por supostamente serem nocivas e influenciar negativamente pessoas tão jovens e inocentes, na verdade davam mais sentido a suas vidas. Antes ouvir músicas de certo modo violentas que tornar-se violento. Mais que isso, esses jovens encontravam um lugar no mundo, descobriam pessoas com os mesmos problemas. Sem a hipocrisia dos falsos moralistas, que reprimiam seu lado sombrio, sabiam que o bem e o mal estavam dentro de cada ser humano. Através de letras realmente chocantes, travavam conhecimento com este lado mau, canalizando sua energia de forma mais sadia. Já reparou nas turmas de metaleiros (cada vez mais raras)? Ao contrário dos skinheads, dos mauricinhos que espancam empregadas domésticas, dos torcedores nos estádios, dos marines americanos cheios de espinhas matando iraquianos com a mesma alegria que exterminam demônios no videogame Doom, o metaleiro é pacífico, na dele, tem muita personalidade, preocupa-se em ter opinião própria sobre as coisas, em geral não usa drogas. Se você é pai de um adolescente, sentiria-se mais tranquilo se ele (ou ela) fosse a um baile funk ou a um show do tipo "tributo ao hard rock"?


Dee Snider cumprimenta os Congressistas

Então porque foram tão perseguidos? Nos anos 80, a mulher do Al Gore, Tipper, liderou uma campanha para o banimento das bandas de heavy das rádios, das lojas de disco etc. O genial Dee Snider, do Twisted Sister (We ain´t gonna take it, lembra, com aquele clipe insano, e que foi tão imitado hoje é ironicamente desprezado?), sentiu-se incumbido da missão de defender a si mesmo e seus colegas na Corte. Cara a cara com seus maiores detratores, poíticos importantes, chegou usando uma jaqueta jeans rasgada e aquele cabelão indescritível. Os caretas debochavam dele, mas vacilaram ao subestimá-lo. Tirou do bolso um discurso contundente, bem articulado, objetivo, nunca resvalando na vulgaridade ou na empáfia de seus acusadores. Uma de suas músicas falava do tratamento dentário de um cara ou algo assim, mas a Sra. Tipper viu-a como uma apologia a um monte de coisa ruim, tipo estupro, subserviência, crueldade ou coisa que o valha. Snider disse que cada um interpreta a música a seu modo, de acordo com sua vivência, crenças e sonhos; que se a cabeça dela está cheia merda, ela vai ver merda.


Alice Cooper teve um show proibido em Londres. Ele encenava uns atos violentos e arrematava simulando sua própria decapitação. Ele quis saber o motivo da censura. Violento demais? Macbeth, peça de Shakespeare, só prá citar um entre uma infinitude de exemplos, é um banho de sangue, mas é leitura obrigatória no ensino anglo-americano. Tinha nudez ou mandava a rainha se foder? Não. De fato, os censores ingleses não encontraram uma explicação plausível para vetarem Alice. Particularmente, acho suas pantomimas de um profundo mau gosto. Mas desde quando a estética - no caso, a ausência dela - pode ser passível de censura? Isso me remete ao filme O Povo Contra Larry Flynt. Transcrevo aqui parte do discurso (real) do advogado Alan Isaacman na Suprema Corte dos E.U.A. em defesa do pornógrafo mencionado acima e sua infame publicação, a revista Hustler:


Ladies and gentlemen of the jury, you have heard a lot today, and I'm not gonna go back over it, but you have to go into that room and make some decisions. But before you do, there's something you need to know. I am not trying to suggest that you should like what Larry Flynt does. I don't like what Larry Flynt does, but what I do like is the fact that I live in a country where you and I can make that decision for ourselves. I like the fact that I live in a country where I can pick up Hustler magazine and read it, or throw it in the garbage can if that's where I think it belongs.

Atendendo a pedidos, a tradução:

Srs. e Sras. do júri, vocês ouviram muito hoje, e não vou voltar ao assunto, mas vocês têm que entrar naquelasala e tomar umas decisões. Antes disso, há algo que precisam saber. Não quero convencê-los a gostar do que Larry Flynt faz. Eu não gosto, mas gosto do fato de viver em um país onde você e eu podemos tomar nossas próprias decisões. Gosto do fato de viver em um país onde posso pegar a revista Hustler e lê-la, ou posso jogá-la no lixo se achar que este é o lugar dela.


Ainda tenho muito a falar do assunto, mesmo porque ao revisar esse texto agora é que notei que fugi do tema e ficou meio sem pé nem cabeça. Continua

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

orodetolo


Às vezes leio a coluna de um cara que escreve para O Tempo, um jornal local bem chinfrim. Um dia desses ele fez uma paródia da famosa música do Raul Seixas... me faltam palavras para tanta...

Eu devia estar contente porque tenho um emprego, sou apenas um rapaz latino-americano, dito um cidadão desprezível e ganho R$ 379,90 por mês. Eu devia agradecer o Senhor por ter sucesso na vida, apesar de ter medo de avião e ter percebido que no fundo sou igual a meus pais. Eu devia estar feliz porque consegui comprar uma Kombi Miss Sunshine 73.

Eu devia estar grato ao Todo-Poderoso pelo trocador do ônibus ter troco pra cinco reáu e por ter sido reconhecido pelo garçon do self service na fila do banco. Eu devia estar rindo à toa porque só faltam 11 prestações, sem juros, no cartão da minha avó, da TV telefunken que comprei nas Casaa Bahia, onde você pode dvder o quanto quiser.

Eu devia estar sorrindo porque finalmente comprei uma dentadura.
Eu é que não me levanto da mesa de bar onde sentei sem ser convidado e filei o conhaque do velho, apesar dos protestos gerais. Porque foi tão fácil conseguir e agora eu intimo "e daí?" eu ainda tenho muita cara de pau, então peço um old eight na conta do outro e se alguém achar ruim pode cair pra dentro.

Eu é que não me sento pois prefiro ficar deitado vendo big brother enquanto minha mulher estranhamente demora 4 horas só pra levar uma xícara de açúcar pro vizinho lutador de jiu jitsu. Porque longe do Copacabana Palace e dos
Champs Elysées, mas na porta da minha casa se assenta a sombra sonora e malcheirosa de um cobrador.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Irmãos Coen e coisas redondas e divertidas

Os irmãos Coen voltaram à moda com mais um filme rude, violento e esquisito. Onde os fracos não têm vez é forte candidato a um punhado de oscars, mas nem o fato de eu estar com o dvd pirata do filme foi motivo suficiente para eu me atrever a assisti-lo. Muita gente diz que não está nem aí pros oscars, e eu estaria mentindo se dissesse que sou uma delas. Então porque não vejo o maldito filme, já que adoro os caras, como se pode ver na lista ao lado? Resposta: pelo que ando ouvindo, parece ser "Coen demais", no mau sentido. Ou seja: peca pelo excesso de cenas chocantes, por aquele distanciamento que imprimem a suas obras mais "sérias", tornando-as pouco humanas e a identificação com qualquer personagem improvável. Como em Gosto de Sangue (Blood Simple) ou O Homem que não estava lá (The Man who wasn´t there). Por alguma razão, apesar de ter as mesmas características, não acho Fargo "Coen demais". Talvez por causa do Steve Buscemi ou pelo sotaque hilário dos personagens. Sei lá. O negócio é que se alguém fala mal desse filme sinto como um parente próximo foi insultado e dá vontade de voar no pescoço do cara. Mas não é disso que queria falar.
Entendem o que estou dizendo? Cena do filme mencinado acima

Sinto falta das boas comédias deles, como O Grande Lebowski e, sobretudo, Na Roda da Fortuna (The Hudsucker Proxy). Este último, não por acaso, deve ser o filme mais "humano" dos Coen, no sentido de ser o que mais se assemelha a coisas que gostamos de aninhar e proteger, como filhotes de gatos e cães. Pois trata-se de uma homenagem declarada aos filmes de Frank Capra, um sujeito que realmente acreditava que (quase) todo ser humano era essencialmente bom, justo e honesto e aquele que não fosse era regiamente repreendido até o fim do filme. Mas ainda não chegamos ao que quero abordar.

"Hoopla with the hula hoop"

Na Roda da Fortuna centra-se na epopéia de um ingênuo e bem-intencionado caipira (Tim Robbins) na cidade grande. Como parte de um complô imundo arquitetado pelo personagem de Paul Newman, ele é alçado ao posto de Presidente de uma poderosa corporação, justamente pelo fato de ser um "inocente útil", um cara cuja ingenuidade beira à burrice, e que desse modo, fatalmente levaria a corporação à bancarrota. Aí, com as ações a preço de banana, a companhia seria adquirida pelo maldoso Newman e Robbins sairia da jogada. Mas o que levou o lobo mau a escolher especificamente aquele cordeirinho? Numa sequência impagável, Robbins procura Newman para lhe falar de sua idéia revolucionária, e mostra a ele um papel com um círculo desenhado, e só. Aquilo era o rascunho de um bambolê, ou hula hoop em inglês. Enfim chegamos onde eu queria: bambolês e outras coisas redondas, simples, divertidas, "coquêluchicas", que fazem as crianças pular de excitação e os mais velhos suspirarem, nostálgicos.

Eu amo esse filme

Deu vontade de ver o filme? É, meu caro, não queria botar água na sua fervura, mas a não ser que dê a sorte de deparar-se com ele na tv paga, vais ficar na vontade, porque eu já o procurei e ele inexiste em dvd no Brasil, e as cópias em VHS são escassas. Que peninha. De qualquer modo, a película despertou minha curiosidade quanto às verdadeiras origens do bambolê. E, mais uma vez, a infalível revista Piauí, meu manancial de artigos tão bem redigidos quanto inusitados, me propiciou um post e respondeu a mais uma antiga indagação minha.

Parabéns pro bambolê. Nesse ano ele completa 50 anos. Em 1958, um tal Richard Knerr (pronuncia-se "nur") viu uns garotos australianos fazendo exercícios aeróbicos com aros de madeira. Um ótimo exercício, como reiterou um professor de Educação Física. Humildemente, passo a copiar a revista, eles contam a história melhor que eu:

Foi uma epifania. Knerr e seu sócio e amigo de infância Arthur Melin (a quem só falta uma consoante para ficar com nome de mago) levaram a idéia para os E.U.A., trocaram a madeira pelo plástico colorido, inventaram um nome prá lá de bom e começaram a demonstrar eles mesmos a novidade nos playgrounds da Califórnia. Criava-se ali a mãe de todas as manias. Antes do Cubo Mágico, do Pogobol, do Pacman e do Pokemon, o mundo rendeu-se aos pés - ou melhor, aos quadris - do Hula Hoop, aqui batizado de Bambolê.

E por aí vai. Em seguida somos informados que apenas dois anos depois o bambolê batia a casa dos 100 milhões de exemplares vendidos, a impensáveis US$1,98. O bambolê era uma piada do Juquinha no meio do chá de senhoras, uma bola de chiclete que estourava -ploc! - no jantar de gala. Quem sabe não foi uma das primeiras manifestações inconscientes do movimento hippie que estava por vir na década seguinte, assim como o Chuck Berry cantando Johnny B. Goode?

Mais um produto das Indústrias Wham-O

Knerr e Melin tinham uma empresa de fundo de garagem cujo nome derivava de seu primeiro produto: um estilingue, o zumbido do elástico esticando-se - whammmmmm - e o ruído do projétil acertando o alvo - o! - e estavam criadas as indústrias Wham-O. Cara, se eu fosse o Papa eu batalhava pra canonizar esses dois senhores. O mundo precisa, mais do que nunca, de gente como eles. Pois foram também eles os responsáveis pela popularização do frisbee, em 1955. Cinco anos depois um engenheiro químico levou a eles uma descoberta acidental, um plástico que não parava quieto. Criou-se então uma bolinha endiabrada, assassina serial de louças, taças de cristal, vidraças e o que mais viesse em sua trajetória. A revista não fala, mas creio que por aqui apelidamos a bolinha de "perereca".

Mas, como o Homem, esse animal tão estranho, sempre acaba com a brincadeira e a alegria inerente a ela, a Wham-O acabou vendida para a Mattel, dos bonecos Barbie e Ken, e pouco a pouco foi tragada e descaracterizada pela megacorporação fria e desumana.

Detalhe de uma das capas da Piauí; numa outra Che Guevara usa camiseta com estampa do Bart Simpson!

Quer saber mais? Compre a edição da revista de fevereiro. Ainda estou apreciando-a, bem devagarzinho, porque sei que um dia o Homem vai me privar da Piauí, e, embora isso possa soar ridículo, provavelmente nesse dia vou verter uma lágrima em honra a esse compêndio mensal da genialidade humana, que parece ter sido feita especialmente como uma encomenda para mim - ó, megalomania - , para que minha crença num mundo divertido, curioso, fascinante, plural, nunca pereça.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

I´m not dead

É com um misto de alegria e apreensão que venho informar meus leitores que não abandonei este blog e vou dar prosseguimento à história. Alegria porque abandoná-lo seria como me aproximar das trevas da ignorância e alienação. Por outro lado, estou apreensivo porque a história foi concebida e desenvolvida num determinado contexto que se diluiu numa inundação de eventos insólitos. Mas não largo o osso: desistir da história também seria uma demonstração de fracasso and I ain´t no loser.