quinta-feira, 8 de junho de 2006

Boas Notícias

Todos os engravatados se reuniram em torno da mesa de mogno raro - presente de uma madeireira tailandesa com aval do governo brasileiro - sobre o delicado tapete persa tecido linha por linha com o esmero que só um semi-escravo açoitado pode ter. A serviçal hondurenha serviu chá e petit-fours enquanto pensava no crânio esmigalhado do irmão morto por mercenários. Enquanto trocavam amabilidades e comentavam se o clima seria propício para jogar golfe naquela tarde de quarta, alheios ao aniversário do décimo-segundo ano do massacre de Rwanda, todos ansiavam secretamente ao grand finale daquela reunião. Como se dissesse uma senha, o engravatado da cabeceira tirou do bolso do paletó um autêntico charuto cubano, e todos o imitaram. O diferencial dos bons charutos cubanos reside justamente no fato de ter sido enrolado nas coxas de uma cubana, que particularmente dá graças à Deus por não ter que envolver suas coxas em atividades ainda menos ortodoxas para garantir seu sustento. O homem da cabeceira se levantou com a leveza e elegância que só aqueles que passaram 60 anos se movendo como gazelas afetadas sabem fazer, inclinou-se milimetricamente para seu capacho engravatado acender seu charuto e em seguida deu sua modesta contribuição ao fim da camada de ozônio, soprando uma delicada bruma enquanto recitou sua fala tão ensaiada com a fonoaudióloga:
- Senhores, posso lhes garantir que através de exaustivos relatórios, boletins e pesquisas de campo, que eventualmente geraram gastos fabulosos, forçando-nos a cortar 40% do pessoal e a fechar várias unidades ao redor do mundo, nosso Conselho de Diretores-Acionistas chegou à origem do problema que tanto aflige o nosso espírito corporativo.
Ouvem-se discretos vivas pelo salão, alguns congratulam-se comedidamente, os mais afoitos já consultam seus Breitlings feitos do ouro extraído por homens-gabiru das minas da Índia: têm pressa para jogar golfe e ignorar solenemente seus cabbies. Mais uma baforada, e nesse momento, a serviçal hondurenha, ao entrar inadvertidamente no salão (obviamente esse terrível erro de timing custou seu emprego) vê nitidamente um dragão cuspir fumaça no lugar da cara de seu superior. O Dragão tem sotaque bostoniano, ela mal o compreende:
- O Problema, meus senhores, é que não há problema.
Essa é a deixa para o salão explodir em gargalhadas. Enfim, o merecido regozijo.Todos se levantam e se dirigem para o exterior do prédio, anexo a um indescritível campo de golfe de 12 buracos. Com alguma sorte vão poder dar boladas em serviçais negros e hispanos e fingir que foi sem querer.

Um comentário:

Anônimo disse...

"no lugar da cara de seu superior"? Não entendi essa parte. Porém não me importaria se esses caras não existissem.