quarta-feira, 7 de junho de 2006

Torquato Neto

Me disseram que saiu já há algum tempo a biografia de Torquato Neto - "Pra Mim Chega". Precisamos de cabeças pensantes para nossa época, nossos pais tiveram tantas... Nada contra Renato Russo e Cazuza, mas basta ler umas linhas desse bardo cabeludo com calça boca-de-sino para constatar que ele voava bem mais alto...
Por que será que os gênios, aqueles que pensam à frente de seu tempo, sempre têm destinos trágicos, morrem muitas vezes na miséria, parecem mais vulneráveis às drogas e doenças, como se tivessem uma relação mais íntima com a Morte? James Joyce, Noel Rosa, Baudelaire, Jim Morrison, Jimi Hendrix, John Coltrane, Poe a lista é interminável.
Torquato Neto, indiscutivelmente, faz parte desse grupo. Vejam como ele soube definir o movimento Tropicalista: "A ausência da consciência da tragédia em plena tragédia". Querendo ou não, ao longo de sua vida (1944-72) ele simbolizou os abismos e os vôos que sua geração ousou percorrer. Imagino o que pensaria se Torquato nos visse, jovens de hoje, ensimesmados com nossos MP-3, achando que Ivete Sangalo é MPB e CPM 22 é rock, idolatrando os lutadores da família Gracie e a polícia transformada em grupo paramilitar, sonhando com um bom emprego no escritório de advocacia defendendo bandidos imundos em ternos imaculados, tudo para comprar uma casa em condomínio ultra-protegido e criar seus filhos em bolhas artificiais de alegria e prosperidade. Não estou endeusando os hippies daquela época, a quantidade de drogas que usavam inviabilizaria qualquer projeto concreto de transformação social. Mas pelo menos eles conseguiam olhar além de seus próprios umbigos, seus sonhos eram mais amplos. Dizem que Torquato tinha uns dons premonitórios: antes de o AI-5 ser decretado, ele sentiu uma atmosfera pesada no ar e embarcou num cargueiro rumo à Europa. Gil e Caetano ficaram, foram presos, cabeças raspadas etc. Pois então, acho que se matou porque anteviu que tempos piores ainda viriam.

"Eu sou como eu sou
Pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível"
(do poema Cogito)

Nenhum comentário: