terça-feira, 26 de dezembro de 2006

Jorge Luis Borges


Eu já falei dele aqui. De ascendência portuguesa, este escritor, poeta e ensaísta argentino nasceu em 1899 e faleceu em 1986. Mestre da fantasia, do realismo fantástico, seus contos abordam universos e situações oníricas, muitos plenos de metáforas que remetem à filosofia e às religiões. Se já houve alguém que esteve perto de decifrar qual é a matéria do sonho, este foi Borges. Ele não tinha medo de explorar as trevas do desconhecido, do imponderável e invisível e extrair desses lugares pérolas que foram definidas por seu amigo Bioy Casares como "delírios do racional." Deus, em sua cruel ironia, tornou Borges cego, o que se manifestou em sua obra através de uma crescente produção poética.


O que me levou a falar dele no blog pela primeira vez foi seu conto "Tlon, Uqbar, Orbis Tertius" onde ele investiga um país cuja existência é confirmada apenas por um verbete na The Anglo-American Cyclopaedia (veja em maio, na série sobre teorias conspiratórias). A história sintetiza alguns de seus temas prediletos: o amor pelos livros (sobretudo aqueles que agrupam conhecimento, como enciclopédias e suas moradas, as bibliotecas), a criatividade ilimitada, sem demarcações que separam o real do imaginário, o gosto por tramas labirínticas. A Wikipedia nos lembra que, para Borges, não havia distinção entre inventar e descobrir, palavras sinônimas em latim. Não tenho palavras para descrever o quanto Borges me... mesmeriza, para usar um vocábulo borgiano.
Há ainda muito para se falar de Borges, a cada vez que voltar a ele vou contar uma de suas histórias. Vamos começar hoje com um conto tão emblemático quanto o acima mencionado. Eventualmente posso contar a de Funes, o homem que não se esquece de nada, ou As Ruínas Circulares, um lugar mágico onde um mago tenta criar uma pessoa através de seus sonhos, ou ainda O Aleph, sobre um artefato que permite ver qualquer coisa no universo. Mas hoje vamos visitar uma biblioteca, a maior de todas. Borges achava que se houvesse um paraíso, seria uma biblioteca.

A Biblioteca de Babel

O Mundo é uma biblioteca infinita, formada por salas hexagonais idênticas umas às outras, interligadas por escadas em espiral (espirais são símbolos quase onipresentes, dos maias aos judeus) onde estão guardados registros de todas as dimensões e universos possíveis, volumes aparentemente idênticos, de mesmo tamanho e número de páginas. Mas fora isso, tudo é confuso: as descrições nas lombadas não correspondem ao conteúdo das obras, livros em línguas já esquecidas, outros que não fazem sentido. O narrador, bibliotecário, se pergunta se há alguém capaz de encontrar o livro que revelaria o segredo do Universo e da Existência, esta pessoa seria considerada um Deus e muitos dedicam suas vidas a decifrarem volumes incompreensíveis. A busca por esse livro é ainda mais difícil quando se constata que algumas obras diferem apenas em uma vírgula ou palavra, e mesmo uma diferença tão pequena poderia mudar totalmente o sentido do livro.

espirais... merecem muita atenção, O DNA é uma espiral, precisa falar mais?

Propositalmente ambíguo, uma das interpretações do conto é de que trata-se de uma metáfora em que mundo e livros acabam sendo as mesmas coisas. "Ler um texto é tentar decifrá-lo, mas se considerarmos que o próprio mundo está impregnado de linguagem, a própria realidade pode ser considerada como uma grande biblioteca cheia de textos à espera de quem os decifre." (da Wikipedia).

Fico devendo uns desenhos para dar um enfoque visual a seus mundos fantásticos. Vou procurar. Mas uns fractais me pareceram adequados ao assunto...

P.S. Um fato óbvio me passou despercebido: seria a internet o embrião de uma nova Babel? Pela ritmo alucinante com que a tecnologia tem se desenvolvido, imagino o grau de interação que nossos netos e bisnetos vão ter com o conhecimento (isso se não arruinarmos nossa nave-mãe nas próximas décadas). Downloads no cérebro, mundos virtuais que se confundirão com a realidade, Borges certamente gostaria de testemunhar esses saltos tecnológicos... ou não. A web e a Biblioteca de Babel padecem dos mesmos males, o excesso de informações, muitas delas de veracidade questionável. Pessoalmente, quanto mais surfo, mais me afogo.

5 comentários:

Anônimo disse...

Talvez seja a net a Babel de Borges no que diz respeito à diversidade, mas não a do rigor.

Meio óbvio dizer que já me perdi vezes e vezes nos labirintos de Borges. E em outros tantos jardins que se bifurcam. Hoje, talvez por isso, confunda realidade e fantasia.
Se Borges viu o Aleph, eu o sinto desde que li. Se Borges viu em Homero um imortal sem memória, eu vejo em Borges a eternidade que o talento pode trazer.

Às vezes, preciso de intervalos entre um ou outro livro de Borges, senão... eu mesma passo a me enxergar como ficção.

Anônimo disse...

Olá! Puxa, quanta coisa aqui, pena que não tenho muito tempo.
Rumble, gostaria muito que você, me indicasse uns autores. Seria um grande favor.
Brigado, té mais.

Anônimo disse...

Quanto tempo sem me deliciar com seus textos.Voce escreve de forma tão gostosa,envolvente,bonita....Obrigada por fazer meus momentos aqui imensamente ricos e felizes.Adorei a maneira com que,mais uma vez,falou acerca da riqueza e genialidade de Borges,obrigada cara!.Quanto à animação de Tim Burton,adoro tudo o que ele faz,obrigada,mais uma vez.MUITO OBRIGADA!

paratodos disse...

descobri Borges o ano passado e desde então me delicio com seus livros e histórias fantasticas. ele me fez aceitar a minha não aceitação pelos texto de gabriel garcia marques, era algo que me incomodava. broges é incrivel. texto muito bom esse seu.

Sun disse...

nunca li Borges, vc acredita?
adorei o post...

tb não sei se vai ser melhor para os nossos netos a internet... o verdadeiro conhecimento está nos livros.